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O Natal por aqui.

  • Foto do escritor: Marta d'Orey
    Marta d'Orey
  • 26 de dez. de 2014
  • 3 min de leitura

De ano para ano a saga repete-se. O mesmo cheiro a sonhos e a bolo rei, as mesmas cores de encarnado e verde, o mesmo som do tilintar de sinos e do relógio que dá o compasso da meia-noite.

Dia 23 a tão familiar incredulidade no dia seguinte.

Dia 24:

De manhã o usual apressar entre rolos de papel de embrulho que sobraram do ano anterior, e presentes de última hora a serem comprados, porque agora sim, o Natal passou a ser uma realidade bem presente, e não apenas uma janela de chocolate, com a ânsia de, num dia distante, vir a ser aberta.

Ao almoço é o Natal cá de casa, o que eu mais gosto. Aquele tempinho que sabe tão bem de tanto ser nosso. Só nós nos empenhamos numa missão levada com rigor para que a D, possa esperar o Pai Natal, tal como fez todos os anos, de dedos na boca e o olhar no céu ao qual deram a cor dos seus olhos tão abertos, tão atentos a cada pormenor, a cada movimento. Diria que estamos perante profissionais, capazes de prolongar um sonho, que tem tanto de fictício como de maravilhoso, numa cabeça com nove anos de idade. Só nós sabemos como definir os postos de modo a que ela esteja entretida, enquanto, na sala, as luzes são apagadas, as bolachas e o leite comidos, e os embrulhos postos num monte bem cuidado, onde possam parecer maiores para aqueles olhos pequeninos. Só nós a vemos percorrer o corredor à velocidade da luz, com o coração a palpitar tanto, que ameaça saltar-lhe do peito. Só nós olhamos de frente esta felicidade que, em tempos, também foi nossa e, de certo modo, continua a ser. E depois de estarmos imersos em papel e laços, exploramos cuidadosamente aquilo que alguém soube que nos faria felizes.

Mas o tempo para navegar em barcos pirata, ou nadar na piscina da polly, nunca é suficientemente saciante, porque os vestidos de flanella, os collants e os sapatinhos de pele anseiam o seu uso, do qual usufruem apenas anualmente, e as horas exigem que lhes seja feita a vontade. Assim, lá vamos nós, para o frio cortante da noite, que pedia mais camadas de roupa, sabendo que o dia mal começou.

A festa dura até às 5h da manhã, não se deixando abrandar no ritmo, mesmo que eu peça de joelhos. Depois das trocas e baldrocas, das ceias e dos jantares, ruma-se a casa, com o sol já quase a acordar, com a certeza de umas infelizes três horas de sono.

Dia 25:

Acordar sem abrir os olhos, vestir o mesmo da noite anterior mesmo sendo demasiado cedo, para se ser violentamente picado pela lã dos cachecois acabadinhos de comprar, e enfiar os tais sapatinhos de pele ainda com as bolhas nos calcanhares a latejar, e sair para a missa especial, que dura tanto quanto este dia, também especial, pedir. É uma um cerimónia que, em tempo, não faz cerimónias, e se estende mais em cantos, do que em falas, pelas horas fora. Mas eu não daria estas horas para outra coisa. Afinal são elas que, todos os anos, nos lembram aquilo de mais puro e verdadeiro que dá significado ao que celebramos.

Depois, mais um almoço, recheado de perú e doces, criançada, e muita palhaçada. Depois, mais um jantar.

E assim se passa o Natal de uma menina, que disso quase já não tem nada. Só os mesmos collants rotos pelas gargalhadas dadas com e sem sentido, as mesmas bolhas nos pés que latejam com tanta correria, a mesma aversão pelos cachecois de lã e casacos de flanella que não dão outra opção, senão vesti-los; o mesmo gosto pelo cheirinho da comida que só come com o olhar; e o mesmo cansaço agradável, que só conhece quem vive tanto em dois dias, e que a faz cair que nem pedra, na cama, com a certeza que, apesar do fictício, o Natal tem, sem dúvida, uns toques de magia.

 
 
 

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