DO OUTRO LADO DA JANELA

Ontem recebi um vídeo teu. Dizias o meu nome para a câmara, num jeito "sopinha de massa", e quando te perguntaram quem se diz tua madrinha, soubeste responder com todos os dentes que já tens. Pois é... É isso mesmo que eu sou, parte de ti. Um dia, assinei um papel com um gatafunho que se dizia rubrica e jurei levar-te nos braços, mesmo quando já não lhes coubesses. Pouco me lembro desse dia, para além das pernas a tremer, da voz vacilante ao ler a 1ª Leitura, e da razia aos cabelos das "tias" ao empunhar a vela que se acendia em chama ardente. O que não me cansa as gavetas da memória são os anos passados contigo, que não se contam em números, mas sim, em gestos que se foram desenhando e se fizeram nossos. Aqui, lembro-me de ti todos os dias... Vejo-te na menina que guincha radiante ao correr para os braços abertos da mãe; vejo-te na criança reguila que acorda com os pés de fora e que limita o vocábulo já aprendido, a um simples "não" dito sem pedir; vejo-te no miúdo gorducho que suplica por bolachas no supermercado; vejo-te nas fotografias do meu telemóvel, onde me empurras com a mão e suspiras de exaustão depois de teres passado pela máquina trituradora que são os meus abraços; vejo-te do outro lado da janela a bater com as palmas das mãos no vidro e de sorriso rasgado por detrás das bochechas rechonchudas, quando me vês a passar lá fora. Aí, tu brincas com toda a inocência que o tempo te deu, cais no chão sem chorar porque o bom pacote de irmãos também trouxe um extra em resistência, refilas quando a cozinha fecha e não te servem mais "papa pó", ris-te e os teus olhos rasgam-se em fendas sempre que te pedem que o faças, e quando o vento de Norte te sopra ao ouvido, chamas por mim, e corres até à janela onde me abres o coração.

Saudades Tuas "Bruno-Mal-Disposto".