eles
- Marta d'Orey
- 7 de jan. de 2015
- 3 min de leitura
Já vos expliquei a razão pela qual todas as redes sociais às quais aderi, estão enterradas até ao pescoço, em fotografias de muita criançada a brincar, a rir, a saltar, e a fazer seja lá o que for, por mais desintressante que pareça? Imagino-vos a imaginarem, em deduções óbvias e ditas para o ar em tom de palpite, a razão pela qual são banhados noite e dia com tanta informação, que aparentemente, tem tanto de desintressante com de desnecessária. Por isso, para não vos deixar na margem tão injusta e incerta dos palpites, deduzidos em equações com base na estática da normalidade (à qual eu certamente não faço, nem tenciono, fazer parte), devo-vos uma explicação.
Como já disse, o normal, o "cliché", para mim, é uma seca. Gosto de pensar cada um é diferente, de maneiras tão únicas e incríveis; que temos particularidades que mais ninguém tem, que são nossas e só nossas. Não gosto nada de rótulos. Não gosto das regras que dizem isto e aquilo só porque sim, e ponto final. Mas também não gosto, do diferente só porque sim; para isso andava a tirar fotografias às paredes, e colava um autocolante na testa a dizer "hipster". Também não vou nessa onda.
É por estas e por outras que nunca fui a miúda que tira mais selfies do que os grãos de arroz que mete na boca; que fica com baba a escorrer pelo queixo quando fareja alguém do sexo oposto num raio de 10 metros; que viaja Lisboa inteira a ver se consegue umas belas chapas que lhe dê mais de 200 likes; que vai ao urban no seu melhor kit, para depois sair de lá feliz e alegre, com a fatiota num estado lastimável. Mas ela não se importa porque a vida são dois dias.
Sou sim, a miúda que um dia sonhou ser mãe, e que por isso vê nestes meninos uma alegria especial, que só eles sabem dar; que não se importa de perder umas quantas saídas naquelas noites inéditas, para passar o fim-de-semana em casa das tias mais porreiraças que podia ter arranjado; que quer ver os seus primos crescer, sempre com medo de desviar os olhos. Com medo de olhar para eles, ao nível dos seus olhos, e saber que perdeu algum momento.
E foi na fotografia que arranjei a solução mais alcançável, para combater este medo aterrorizante e inultrapassável, que só o tempo, que não pára quando lhe pedimos, é capaz de trazer. Não tenho nenhuma grande paixão pela fotografia em si, sou sim, uma grande apaixonada por aquilo que fotografo. É aí que reside a arte da fotografia.
E é assim, que deixo impressas as marcas que eles deixam em mim.
É através da lente que aprendo a ser mais forte do que o medo, em cada gesto rebelde da Benedita;
a saber dar-me aos outros, sem pedir nada em troca, com cada abraço da Isabelinha;
a ser confiante com a determinação da Teresinha; a ver o que os outros não vêm sobre o olhar atento da Gracinha;
a enfrentar cada desafio daquilo que é crescer, passo a passo, com o ZM, o Luís, e o Manuel;
a viver aventuras que só a imaginação alcança, em barcos-pirata e terras antes desconhecidas, que só com a criatividade do Francisco, e a perspicácia do João, poderia encontrar;
a ver aquilo que o Mundo tem de melhor, ao som das gargalhadas do Vasco.
Agora já não os largo, nem por nada deste Mundo. Já não sei estar muito tempo sem os ver vir a correr de braços abertos até mim, quando me vêm passar o portão, nem sem sentir o cheirinho daquelas mãos rechonchudas na minha cara. É mesmo disto que eu gosto. De saber ler ,cada vez melhor, naquelas linhas escritas em gatafunhos na diagonal, e manchas de cor. De aprender no improvável, que é a simplicidade.
Por isto, vale a pena agarrar na máquina, e captar esta improbabilidade. Vale a pena deixar o Urban e Santos, para outro dia. Estes nunca saem do mesmo sítio. Por eles, não preciso de pedir mais tempo porque sei que o vou ter. Mas com estes meninos já não se passa a mesma história. Vão crescer até estarem ao nível dos meus olhos, e só aí é que eu vou ver que, afinal, o tempo parou no papel quando em pressionei o botão da câmara; exatamente quando eu lhe pedi.

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